“If you always do what you’ve always done, you will get what you’ve always gotten”[2]

(Se você sempre faz o que você sempre fez, você terá o que você tem sempre conseguido – tradução livre)

 

Gosto desta passagem, pois ela nos faz refletir sobre a necessidade de repensarmos nossas formas de atuação. Institutos e fundações têm sido instigados a inovar e a repensar formas de atuação, mas temos sido cautelosos demais (por diversos fatores) em buscar novas maneiras de fazer as coisas, em arriscar novos métodos, novas ferramentas e novos parceiros. Por que tem sido tão difícil assumir riscos?

O avanço da agenda dos negócios de impacto têm sido uma “pimenta” nesta reflexão, pois eles se constituem como uma nova ferramenta que se soma às demais ferramentas historicamente manejadas pela filantropia em sua atuação, e têm provocado institutos e fundações a entenderem melhor esta aproximação.

A despeito do que tem sido debatido na aproximação entre Investimento Social Privado e o campo de negócios de impacto, dou mais ênfase aqui no texto nos “comos” essa relação pode se desenrolar. Esta tem sido talvez a principal questão do momento. Quais caminhos e formatos institutos e fundações podem seguir para se engajarem neste campo?

Ainda que não haja um consenso suficientemente debatido nem um manual que objetivamente ofereça tais caminhos, algumas questões começam a ganhar certa evidência neste debate. Optei com reunir algumas delas aqui no texto, dentre outras possíveis.

 

  1. Por que não fomentar iniciativas que conversem com o campo de negócios de impacto, mas com foco em aspectos ainda pouco abordados no campo?

– públicos “minoritários” – LGBT, mulheres, negros, periferia, comunidades tradicionais, rurais, etc. Institutos e fundações podem encampar estes públicos no engajamento com este campo. Em geral, negócios de impacto têm sido empreendidos por homens brancos, de classe média-alta de grandes centros urbanos. Temos pela frente uma excelente oportunidade de inclusão dos diversos segmentos poucos contemplados na linha de frente destes negócios.

– por que não tentar encontrar modelos de negócio em áreas até então de complexa modelagem? (defesa de direitos, HIV, etc). Há diversas áreas temáticas pouco exploradas no processo de modelagem de possíveis negócios de impacto e, ainda que haja muitas questões sociais/ambientais não modeláveis como negócio, há algumas que podem sim encontrar alternativas interessantes. Vejo que institutos e fundações poderiam jogar mais luzes nesta direção, pois são temas que vão exigir capital mais paciente e mais disposto a assumir riscos, algo bem mais próximo da filantropia.

  1. Fortalecer a dimensão do “impacto social” talvez seja uma das grandes bandeiras que institutos e fundações podem levantar na aproximação com o campo de negócios de impacto. Afinal, para institutos e fundações deveria importar menos os diferentes mecanismos econômicos (ainda que precisemos aprender mais sobre eles) e mais sobre como se potencializa impacto social nas mais diversas expressões da sociedade – seja como negócio ou não. Neste sentido, emerge com força a necessidade de que a filantropia (ISP) coloque recursos e energia na área de métricas e avaliação, pois é dela que sairão respostas mais seguras sobre o real impacto social que se pretende gerar/potencializar com dado negócio.
  2. Foco no ecossistema tem sido quase um mantra que vem sendo ecoado por diversos atores do campo de negócios de impacto e também do ISP. Fazendo uma analogia à atuação mais histórica da filantropia no fortalecimento das mais diversas expressões da sociedade civil, essa seria a mesma tônica para o fortalecimento das diversas organizações que integram o ecossistema de negócios de impacto. Muitos não percebem que aceleradoras de impacto (ex: Artemísia, Quintessa, etc), organizações da área de avaliação (ex: Move Social, etc), organizações que fomentam negócios de impacto (ex: SITAWI, etc), redes de colaboração (ex: ANDE), cursos de formação (ex: Sense Lab, Amani, etc) e tantas outras organizações do campo, não têm modelos de negócio como os negócios de impacto com os quais elas se relacionam. Portanto, elas atuam praticamente como ONGs e prescindem de recursos e parceiros para viabilizar suas operações e projetos. Seguindo este raciocínio, alguns mas críticos poderiam levantar 2 questionamentos:

A. E se um instituto/fundação/empresa criar sua própria aceleradora de impacto?

Esta já é uma prática presente, mas não parece ser a via única de atuação. Iniciativas in company e similares têm crescido (ex: Cubo, InovaBra, Wyra, etc), mas parecem estar mais focadas em startups/inovação convencional do que focadas exclusivamente em negócios de impacto. De todo modo, este é um caminho possível, mas que, a grosso modo, tende a subvalorizar o trabalho de “meio de campo” que já vem sendo feito pelas diversas organizações do ecossistema. Vale ressaltar que muitas aceleradoras de impacto já possuem reportório, ferramentas e networking sólidos que foram construídos ao longo de uma trajetória de atuação. Isso não se viabiliza da noite para o dia e tem seu valor (ainda que muitas vezes o campo não o reconheça como deveria). Do ponto de vista de “sentido público”, algo premente nas reflexões do campo do ISP, vale refletir sobre qual seria a contribuição mais ‘coletiva’ que um instituto/fundação poderia fazer neste sentido.

B. Por que um instituto/fundação deve apoiar aceleradoras ao invés de se relacionar diretamente com empreendedores de negócios de impacto?

Aqui o argumento é bastante simples. Sem o trabalho destas organizações do ecossistema não há (não haverá) negócios de impacto em quantidade e qualidade suficiente para todos os institutos/fundações/empresas estabelecerem parcerias e realizarem investimentos. Simples assim. Não há negócios aptos para todos, caso todos quisessem, neste momento, estabelecer esta relação direta. Portanto, há um argumento prático que pesa a favor da necessidade de que mais organizações do ecossistema sejam criadas/fortalecidas (em quantidade e qualidade) para que mais e mais empreendedores estejam com seus negócios de impacto aptos e em condições de estreitarem relacionamentos com institutos, fundações e/ou empresas.

– Por que não criar oportunidades para que gestores e equipes destas organizações do ecossistema possam co-construírem modelos de negócio e/ou estratégias mais robustas de sustentabilidade? Esta seria uma importante forma de institutos e fundações contribuírem para um sentido mais “público” deste campo dos negócios de impacto.

 

  1. Aprender fazendo

Não há um rito de passagem para que institutos e fundações passem a atuar no campo de negócios de impacto. Não há uma única porta de entrada, mas sim várias. Portanto, o mais sugerido é ir colocando a mão na massa mesmo se muitas dúvidas ainda estejam no ar. Os dados do último Censo GIFE revelaram que, na média, 42% dos associados declaram atuar com negócios de impacto. Ao olhar com mais profundidade este dado, observa-se que o tom desta atuação é muito mais exploratória – tentar compreender melhor este tema e suas interfaces e tentar identificar os “comos”. Isso revela o quanto este tema é novo e desperta ainda várias dúvidas entre institutos e fundações. Como posso atuar com este tema? Quais são as barreiras e como superá-las? Quais dicas e caminhos percorrer?

Àqueles que esperam por um manual de instrução lamento informar que ele não existe. O próprio GIFE está finalizando uma publicação sobre o tema, que será lançada no Congresso, em abril. Ela não terá o escopo de um guia, mas sim adensará e sistematizará esta reflexão sobre o papel que institutos e fundações podem imprimir neste campo. Sem dúvida, será uma boa contribuição ao campo e trará boas “luzes“ neste debate.

Mesmo não havendo um passo a passo disponível, o modus operandi dos empreendedores de negócios de impacto nos dão boas pistas sobre como podemos mergulhar neste campo – experimentar, prototipar, testar. Mesmo que não tenhamos todas as questões resolvidas em nossa organização, é possível começar a colocar a mão na massa. Se sua organização já vem acompanhando eventos e debates sobre o tema, porque não começar a colocar em prática alguma ação? Comece pequeno, destinando uma parte do seu orçamento para experimentar, busque parceiros que já atuem no campo e com os quais sua organização tenha alguma sinergia, converse com outros institutos e fundações que já estão trilhando este caminho.

Só estes movimentos em si já vão desencadear bons aprendizados e diversos encaminhamentos. Lembre-se que o seu “como” pode ser bem diferente do “como” de outra fundação, afinal, os caminhos são múltiplos e dinâmicos. Mas vale um alerta: o “como” que estamos buscando é mais tolerante ao risco, ao teste e ao erro, bem diferente do modus operandi mais tradicional que tem guiado institutos e fundações até aqui. Incompatíveis não, apenas diferentes.

 

[1] Gerente Executivo do Instituto Sabin (www.institutosabin.org.br). Atualmente coordena a Rede Temática de Negócios de Impacto do Gife (Grupo de Institutos, Fundações e Empresas). Membro do Conselho do Gife. É autor do livro “Reflexões contemporâneas sobre Investimento Social Privado”. [email protected]

[2] Do estudo: https://dafne-online.eu/wp-content/uploads/2018/01/Enlarging-the-Space-for-European-Philanthropy-joint-EFC-DAFNE-study_2018.pdf

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