Trabalhei 8 anos no Governo Federal
(de 2003 a 2010)
em vários ministérios
Sem dúvida, uma experiência riquíssima
sobretudo para quebrar preconceitos que carregamos conosco:
– de que o Estado não funciona
– de que só há gente encostada por lá
Parêntesis rápido
não sou filiado a partido político
Estive nestes 8 anos com contratos
de consultoria por produto
via organismos internacionais
Aliás, prática muito comum na Esplanada
(há um maravilhoso mundo dos ‘Prodocs’)
Lamento informar aos corneteiros de plantão
Mas há muita gente engajada dentro do Estado
E sim
Ele é bem burocrático
Quando trabalhei no Ministério do Meio Ambiente (MMA)
Marina Silva era a ministra
Ali já se manifestava certa influência religiosa em sua gestão
e sua falta de pulso para se posicionar frente a questões do dia a dia
Em termos de integridade, impecável
Foi um período interessante para o MMA
Com avanços diversos
Criação do Serviço Florestal e ICMBio
ambas medidas, bastante criticadas na época
(e vivendo tempos deploráveis hoje em dia)
Me lembro quando o Carlos Minc assumiu o MMA
(em 2008)
Entregamos uma carta pra ele
pra não desmontar parte das políticas que tínhamos construído
Ele confirmou que não desmontaria
E pouco tempo depois desmontou (quase)tudo
Mesmo partido, mesmo governo e mesma descontinuidade
tão comum no mundo das políticas públicas
Trabalhei também no MEC
logo após o Cristóvam Buarque ter sido demitido por telefone
desde então, saiu magoado e passou a detonar seu ex-partido
Mas cá entre nós, foi um ministro que não deixou saudades
Hoje perambula por Brasília cabisbaixo
por ser uma ‘carta fora do baralho’
mesmo na política local
Lá no MEC
descobri o que era um ministério grande
em termos de orçamento e força política
Enquanto o MMA era ‘peixe pequeno’
O MEC era gigante
(e paquidérmico, lento e travado)
Passei por vários outros órgãos federais
(Secretaria de juventude (SG/PR), IPEA, Ministério da Justiça)
E aprendi que o governo não fala a mesma língua
com forças remando para diferentes posições
num mesmo Governo
e até mesmo, num mesmo Ministério
Compreendi na prática o sentido do tal ‘pacto federativo’
e o quanto ele complicava a nossa a vida
na implantação de Programas e Políticas Públicas
UFs da ‘oposição’ política seguravam a implantação
de vários Programas federais relevantes
como parte da disputa partidária
Aprendi sobre o papel dos Conselhos de políticas públicas
(estes mesmos extintos na canetada)
e sobre os limites dos processos participativos
no esteio da crise do modelo de democracia representativa
(mas ainda sim, menos pior que a onda autoritária atual)
Dos vários processos de Conferências Nacionais
em que estive envolvido
inovações foram criadas que até ontem seguiam por aí
Percebi a força do corporativismo
dentro e fora do Governo
Categorias profissionais, grupos de servidores
atuando em prol de seus próprios interesses
Entendi que servidores públicos e técnicos
são profissionais que
faça chuva ou sol
entre e sai governos e partidos políticos
seguirão lá fazendo a máquina
andar ou parar
Alguns cruzam a fronteira
e vestem ‘camisas’ partidárias
Outros vão para a geladeira
quando outras correntes ideológicas assumem o poder
Voltaria a atuar no governo?
Sinto saudades?
Acho pouco provável voltar
Pois o mundo ‘privado sem fins lucrativos’
é infinitamente mais ágil
Mas, convenhamos
buscamos incansavelmente
a tão falada ‘escala’ em nossos projetos
quesito este ‘prato cheio’ no Governo Federal
Só pra ilustrar com um dado
O Brasil tem mais de 100 milhões de pessoas
Sem acesso a rede de esgoto
(fonte: http://www.tratabrasil.org.br/images/estudos/itb/ranking-2018/press-release.pdf)
Imagina que baita aprendizado o ciclo de uma política pública
para enfrentar esse desafio!
Tenho visto uma tendência de institutos e fundações
de se aproximarem de governos para apoiar políticas públicas
Sem dúvida, uma ótima possibilidade
Apoiar startups e negócios de impacto a ‘plugarem’ suas soluções
junto ao Estado
Sim, é preciso assumir riscos para isso ser mais real
Sim, há travas burocráticas (várias!) neste caminho
Sim, dá pra fazer e já há gente fazendo
(de forma legal, sempre é bom frisar)
Enquanto colegas de institutos e fundações
experimentam essas parcerias em âmbito municipal
Adoraria ver isso acontecer em âmbito federal
Mas tal como no futebol
Brasília também joga na segunda divisão
na agenda de institutos e fundações
Que pena!
Alguns têm feito advocacy junto ao legislativo federal
mas articulação com órgãos do executivo federal
ainda são tímidas
Um bom gestor público?
Aquele que:
– se posiciona e toma decisões
– assume riscos e faz a máquina andar
– consegue equilibrar perfil técnico e político
– tem uma equipe de confiança e competente
(mix entre servidores, consultores e cargos de confiança)
Ele existe?
Sim! Há muitos por aí
Muita gente comprometida
Mas vivemos tempos de
lamentável demonização da política
Pois como não há vácuo no poder
abre-se espaço para forças e interesses
de todos os tipos
entrarem em cena
(vide influência da bancada do BBB – boi, bíblia e bala
só pra citar um exemplo)
Viver a experiência da gestão pública
por dentro
É um aprendizado riquíssimo
para qualquer profissional
De fora
É fácil ficar criticando
a ineficiência e a burocracia
do setor público
Mas por dentro
a máquina de moer carne
gira em outra rotação
e de forma muito mais complexa
do que tendemos a imaginar
Quem já foi moído
Que atire a primeira pedra.